ESTÁDIO VIVALDO LIMA VAI SAIR DE
CENA PARA ENTRAR NA HISTÓRIA
Texto: Osny Araújo
Manaus - Parece mesmo que no mundo tudo tem começo meio e fim. Seguindo essa máxima, está em fase terminal na UTI o estádio Vivaldo Lima. Será demolido para dar lugar à moderna e ecológica Arena da Amazônia, um grande complexo esportivo que será palco de alguns jogos da Copa do Mundo de 2014.
Recordo, que como repórter esportivo da Rádio Rio-Mar de Manaus, ainda muito jovem, ajudei na cobertura de inauguração desse estádio, que foi por muito tempo o maior e o mais bonito palco do futebol da Amazônia brasileira, apelidado na época de “Tartarugão do Norte”, alcunha bem apropriada pela sua própria forma, mas, que não pegou e foi batizado popularmente de “Vivaldão”, numa alusão ao médico Vivaldo Lima que emprestou o seu nome ao também conhecido “Colosso do Norte”.
Trabalhei na cobertura de memoráveis jogos de futebol, eventos culturais e outros, como o Congresso Eucarístico Nacional no início dos anos 70 e de outros grandes e marcantes acontecimentos no monumental palco que vai sumir do mapa, em nome da modernidade e do futuro que esperamos chegue com a Copa, deixando um grande legado para o Amazonas e para a Amazônia, mas especialmente para a cidade de Manaus.
Confesso, que como repórter esportivo na época, vivi grandes e inesquecíveis momentos que guardarei sempre na lembrança e no filme da retina, como por exemplo, a primeira entrevista que fiz com o rei Pelé, o maior jogador de futebol do mundo em todos os tempos.
Antes do “Vivaldão”, quando Manaus praticava um futebol vibrante e envolvente, especialmente por parte de Nacional, Rio Negro, Fast e São Raimundo, os jogos tinham como palco os estádios do Parque Amazonense, no Beco do Macedo e Ismael Benigno (Colina), no bairro de São Raimundo e ainda os jogos menos importantes eram disputados no campo do Nacional, na Vila Municipal, até que veio o Vivaldo Lima e aí, tudo mudou e misteriosamente, algo sem uma explicação lógica, o nosso vibrante futebol começou a perder forças, mas ainda assim, aos troncos e barrancos vai sobrevindo, mesmo sem o apoio das empresas que integram o Pólo Industrial de Manaus, (PIM) que preferem patrocinar clubes do Sul e Sudeste e Sul.
Mas, vamos voltar a falar do nosso “Vivaldão”, um monumento construído no bairro de Flores que certamente vai deixar saudades, especialmente para os mais velhos, que assistiram a grandes clássicos disputados no seu gramado com a participação de equipes nacionais e experimentaram fortes emoções.
A idéia de construir um grande e moderno estádio em Manaus surgiu na época do trabalhismo, quando era governador o saudoso Plínio Ramos Coelho (PTB).
A pedra fundamental chegou a ser lançada, mas a idéia não evolui e as obras só foram iniciadas já no período militar, na administração do governador Arthur César Ferreira Reis, que governou o Estado no período de 1964 a 67.
Manaus era uma cidade pequena, um quase porto de lenha, como afirmação na música o companheiro Aldízio Filgueiras. Tinha pouco mais de 250 mil habitantes e para os lados onde hoje está o “Vivaldão”, a cidade terminava no Hospital Eduardo Ribeiro, no bairro de Flores, considerado muito longe do centro nervoso da capital.
Foi nesse local, no seguimento da Avenida Constantino Nery, onde havia apenas um grande buraco, feito na administração trabalhista, que o estádio verdadeiramente começou a ser construído.
A área era praticamente desabitada e o movimento nos fins de semana ficava por conta dos vários balneários que existiam nas imediações.
Convidado pelo então governador Artur Reis chegou a Manaus o arquiteto mineiro Severiano Mário Porto, que fez o projeto, mas ainda assim, a obra não prosperou. Tudo parou nas fundações e só foram reiniciadas em 1967 quando o empresário Danilo Duarte de Matos Areosa assumiu o Governo.
Para Manaus, uma cidade de economia fraca,que tinha a época como prefeito nomeado o então jovem Frank Abrahim Lima, a obra era grandiosa, considerada por muitos como um grande “elefante branco”, mas o governador não desistiu da idéia.
Lembro, que como repórter esportivo da Radio Rio Mar à época, num concurso de reportagem com os companheiros Geraldo Viana, Carlos Alberto Alves e Nicolau Libório, fiquei em segundo lugar ao colocar no ar uma entrevista com o não empossado governador Areosa, dizendo que ele iria construir o estádio. Fui vencido pelo Geraldo Viana que entrevistou os figurões da CBF à época capitaneada a época por João Havelange garantindo naquela oportunidade que a Federação Amazonense de Futebol (FAF), que nasceu de uma cisão com a Federação Amazonense de Desportos Atléticos (FADA), seria reconhecida pela entidade maior do futebol com isso, deixaria de ser clandestina, fato muito festejado pelos esportistas bares.
AJUDA DAS EMPRESAS CABOCLAS
Com uma economia sofrível, o Governo precisava de recursos extras para levar em frente o projeto da construção do estádio e foi aí, que entrou o trabalho abnegado do jornalista e empresário Flavio Limongi, primeiro presidente e fundador da FAF, que arregaçou as mangas juntamente com outros abnegados companheiros, como o locutor Arnaldo Santos e somaram com o Governo na busca dos recursos necessários para tocar a obra.
Nessa empreitada para conseguir recursos, vale destacar o espírito patriótico dos empresários locais que atuavam no ramo de refrigerantes, que atenderam aos apelos do Governo e do Limongi e autorizaram a destinação de 1% dos seus faturamentos para ajudar na construção do estádio que mais tarde viria também a ser conhecido como o “Monumental do Norte”.
As empresas amazonenses que participaram dessa importante e histórica campanha, foram as fabricas Magistral, Baré, Tuxaua, Andrade e Luzéia, sendo que as duas últimas não existem mais.
As empresas responsáveis pela construção eram a Irmãos Prata e a Cointer, mas, por falta de caixa as obras foram paralisadas em 69 e só retornariam no ano seguinte, quando outras empresas se juntaram ao projeto, como Brahma, Livraria Escolar e a Loteria Esportiva do Amazonas, sem as quais o projeto estaria inviabilizado.
Eufórico com andamento das obras, o governador Danilo Areosa queria inaugurar o estádio em grande estilo e foi aí, que mais uma vez, entrou em campo presidente da FAF Flaviano Limongi que utilizando a amizade pessoal que mantém até hoje com o então presidente da CBF João Havelange e conseguiu agendar um jogo da Seleção Brasileira, num estádio ainda não inteiramente acabado, aproveitando a passagem da Seleção que passaria por Manaus para disputar a Copa do Mundo no México.
Tudo deu certo e a nossa Seleção fez dessa forma uma pre-inauguração do estádio Vivaldo Lima, enfrentando a Seleção amazonense que terminou goleada pelo placar de 4x1, com o atacante canarinho Dada Maravilha, entrando para a história como o jogador que marcou o primeiro gol no novo estádio brasileiro e o maior do Norte.
Dada maravilha, com suas frases antológicas, respondeu a mim quando lhe perguntei qual era a problemática da Seleção no ataque brasileiro e de imediato respondeu:” A problemática eu não sei, mas sou a ‘solucionáutica” e completou dizendo que no mundo só três coisas param no ar – Beija-flor, helicóptero e o Dada.
Parece que o fato deu sorte aos nossas craques da Seleção que retornaram do México com o tri-campeonato mundial de futebol, após memorável e histórica jornada nos gramados mexicanos.
O jogo na longínqua e histórica tarde de e um domingo, 5 de abril de 1970, arbitrador por Arnaldo César Coelho, hoje comentarista de arbitragem da Rede Globo de Televisão, aconteceu de forma muito festiva para um público superior a 36.828 espectadores, aglomeração nunca vista antes na cidade.
Na realidade, o estádio só ficou inteiramente concluído em 1971, já na gestão do governador João Walter de Andrade e a partir do ano seguinte passou a ser palco de jogos do Campeonato Brasileiro, num formato diferente do atual e por aqui passaram grandes equipes do nosso futebol, como Vasco, Flamengo, Corinthians, além de um amistoso entre Vasco e Flamengo, vencido pelo Cruz de malta de gol de Roberto Dinamite, hoje deputado estadual pelo Rio e presidente do Club.
No ano de 1995, no Governo de Amazonino Mendes, atual prefeito de Manaus, o estádio passou por uma grande e completa reforma, incluindo no projeto a modernização das instalações o que ofereceu mais conforto ao público. A re-inauguração aconteceu no dia 20 de dezembro do mesmo ano, a oportunidade em que o Brasil bateu a Colômbia por 3x1. Agora, em 2010 para cumprir projeto da FIFA e ser uma das sub-sedes da Copa do Mundo de 2014, o “Vivaldão” vai virar entulho e deixar muitas saudades e belas recordações.
Alguns detalhes sobre o estádio que vai desaparecer: Inaugurado em 5 de maio de 1970 e reformado em 95, de propriedade do Governo do Estado do Amazonas.
O gramado tem 108x70 m e teve como arquiteto Severiano Mário Porto. Capacidade atual é de 32 mil pessoas, mas já comportou 56.950 espectadores, em jogo entre o Cosmos dos Estados Unidos e o Fast Club de Manaus, que terminou com o placar de 0x0. Esse foi o seu maior público, quando as arquibancadas ainda não tinham cadeiras e as gerais eram liberadas para a torcida.
O estádio tem um sistema sonoro importado da Bélgica, catracas eletrônicas e o gramado possui irrigação automática com drenagens vertical e horizontal. Em 206 ganhou um novo placar eletrônico, inaugurado oficialmente em 14 de fevereiro de 2007 com o jogo entre Fast e Vasco da Gama, válido pela Copa do Brasil.
DADOS E NÚMEROS INTERESSANTES
Nesta matéria, estamos relacionados os dez maiores públicos recebidos pelo estádio Vivaldo Lima, incluindo clubes estrangeiros, brasileiros e amazonenses.
*Em 9 de março de 1980, um público de 56.950 pessoas assistiu ao amistoso internacional entre Fast de Manaus e Cosmos (EEUU), jogo que terminou empatado em 0x0.(amistoso).
*12 de dezembro de 1999 – O Fluminense (RJ) venceu por 1x0 São Raimundo (AM), perante um público de 55.188 espectadores.(Campeonato Brasileiro Séria C).
*4 de abril de 1999 – Sampaio Correia (MA) venceu o São Raimundo por 2x1, com um público de 47.211 pagantes.(Copa Norte).
*22 de julho do mesmo ano, o São Raimundo diante de um público de 47.188 espectadores venceu o Rio Negro pelo placar de 3x1.(Campeonato amazonense).
*20 de dezembro de 95, 37.157 pessoas assistiram o Brasil derrotar a Colômbia por 3x1.
*31 de agosto de 1973, com um público de 43.047 pagantes, o Nacional (AM) empatou em 1x1 com o América (RJ) – Campeonato Brasileiro.
*26 de outubro de 1986, Nacional (AM) perdeu para o Corinthians (SP) por 3x0, diante de um público de 43.118 assistentes. (Campeonato Brasileiro).
*27 de agosto de 1986, 41.661 pessoas assistiram o Nacional derrotar o Rio Negro por 1x0. (Campeonato amazonense).
*22 de maio de 1996 Brasil e Croácia jogaram para um público de 41.451 pessoas. (Amistoso).
*6 de Setembro 1979, 40.193 pessoas assistiram o Nacional vencer o Rio Negro por 1x0. (Campeonato amazonense).
Ainda como um dado interessante sobre a história do estádio Vivaldo Lima, foi um clube de Portugal o primeiro elenco de futebol estrangeiro que jogou no “Vivaldão” que ainda não havia completado dois anos em atividades.
O Futebol Club do Porto veio a Manaus para dois amistosos, contra Nacional e Fast e venceu os dois confrontos por 3x1 e 3x2 – respectivamente.
Também é importante mencionar que a Seleção Brasileira de Futebol, pentacampeã do mundo jogou 5 vezes no Vivaldo Lima, sendo apenas uma oficialmente.
#5 de abril de 1970 – Brasil 4 x 1 Amazonas (amistoso com as seleções B).
Na mesma data, as seleções titulares de Brasil e Amazonas jogaram na inauguração do estádio e o placar de 4x1 se repetiu.
#20 de dezembro de 1995 – Brasil e Croácia empataram em 1x1 (amistoso).
#18 de dezembro de 1996, Brasil 1x0 sobre a Bósnia (amistoso).
#19 de setembro de 2003 – Brasil 1x0 Equador (Eliminatórias da Copa do Mundo).
QUEM FOI VIVALDO LIMA
Mas, finalmente quem foi essa ilustre figura pública, Vivaldo Palma Lima que emprestou o seu nome ao estádio que está saindo de cena para adentrar na história.
Vivaldo Palma Lima, um simplesmente Vivaldo Lima foi um homem apaixonado pelo esporte foi advogado, médico, professor, cirurgião-dentista, farmacêutico e político.
Ele nasceu na Bahia e chegou a Manaus por volta de 1902 como médico do Loyd Brasileiro, aqui fixou residência e se transformou num amazonense por opção. Sua participação na vida da cidade era intensa, especialmente no campo intelectual. Morreu aos 72 anos quando exercia o cargo de deputado federal pelo Amazonas.
Foi sócio-benemérito, presidente e presidente de honra do Nacional, Fast e sócio-honorário do Luso Sporting Club de Manaus e da União Esportiva Portuguesa.
Para finalizar está matéria que traçou um pouco da história do estádio Vivaldo Lima, anunciamos que o arquiteto Severiano Mário Porto, ganhou com esse magnífico projeto o Prêmio Nacional de Arquitetura em 1996, enchendo os amazonenses de orgulho. Nas fotos de aruivo, vista aérea do estádio, parte interna e a torcida do Vascão. (Fontes: Arquivo pessoal, FAF, CBF e mídia local).
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