Os Cinemas da Manaus Sorriso
*Almir Barros
Domingo na Manaus da década de 60, missa na Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora, na Silva Ramos, em frente a Vila Miri. Todos nós, com carinhas de anjos, éramos "obrigados" a assistir a Santa Missa, que nos servia como "Passaporte" para irmos ao cinema. Eu, Getúlio, Alzeir, Luis Mário, meu irmão João, Lobinho, Vital, Sabá Marinho, La-deira, só moleque danado. O Getúlio ajudava o Padre e com a cara mais cínica,ficava olhando para cada um de nós até que começávamos a rir em conjunto.
Coitadas das freiras que tentavam em vão nos fazer parar e nos comportar.
Éramos, na linguagem das beatas e das freiras, verda-deiros demônios na pele de meninos.
Manaus possuía nessa década, muitas Casas de Projeção, no que pese o tamanho da cidade com aproximadamente 250.000 habitantes. Interessante é que em cada uma dessas Casas de Projeção,era exibido um tipo de filme, por exemplo: de Romanos, de Bang-Bang(no avenida e Ypi-ranga e Guarany), de Aventuras, de Ficção (Politeama e Popular), e as-sim por diante.A seguir os cinemas de Manaus:
1.Odeon - localizado na esquina da Avenida de Eduardo Ribeiro/Saldanha Marinho, onde hoje está instalado um Edifício suntuoso de um Shopping Center. Casa luxuosa, com cortinas que separavam a Sala de
Espera da Sala de Projeção, com estofados, bebedores e bombo-niere; ali esperávamos o término de uma sessão, para podermos aden-trar e assistir ao filme escolhido. Era o cinema dos apaixonados (por passar filmesromânticos).
A sessão das 16:00h, era praticamente re-servada aos casais de namorados. Assisti a muitos filmes nesse Esta-belecimento como : Love Story, Romeu e Julieta, Dio Como Te Amo, La Novia, A Noviça Rebelde e tantos outros (devidamente acompanhado) Era a época do Ginásio, as namoradas eram muitas e o Romantismo aflorava. Manaus era na verdade uma cidade verdadeiramente sorriso,tranquila, brejeira, situada á margem esquerda do coração do RioNegro.
2.Cine Politeama - Na Avenida Sete de Setembro/Getúlio Vargas (sobrou somente a fachada pela Sete de Setembro)- Do mesmo Grupo do Cine Ode-on,era um cinema muito frequentado por estudantes do Ginásio. Lembro de dois fatos acontecidos ali: Estávamos na maior bagunça, gritando e batendo nas cadeiras, quando de repente as luzes são acesas e aparece nada menos que a fi-gura de nosso diretor, professor Maneca, que só no olhar, mandou que todos nós levantássemos e nos dirigíssemos para a saída. Consegui me refugiar no banheiro e mais tarde voltar para a Sala de Projeção, onde assisti ao filme,dessa eu escapei mas, outras viriam, como a do Cine Guarany... Outro fato aconteceu ainda lá fora, próximo às bilhe-terias: Um amigo doido prá fumar, avista o Matá-Matá, um viado muito conhecido à época, fumando, aproximou-se e pediu um cigarro. O viado respondeu que só tinha aquele que estava fumando;O colega pediu o vinte(resto do cigarro).O viado na maior cara de pau respon-deu:_acabei de chupar uma pica!Claro que o colega não quis mais ficou todo sem jeito.
3. Cine Éden - Na Rua de Jonathas Pedrosa,próximo a Ponte da Sete de Setembro, onde hoje se localiza o Parque Jefferson Péres(O prédio conserva suas características originais). Deixou de funcionar por uns tempos e voltou com o nome de Cine Veneza. Cinema acanhado mas que, quando reabriu com o nome de Veneza, voltou repaginado e moderno, e-xibindo filmes clássicos do cinema mundial, como Inferno na Torre, O Destino do Poseidon, Kramer X Kramer, O Campeão, O Exorcista e ou-tros.Comecei a namorar com a Inês (uma carioca linda, que estudava no Colégio Auxiliadora)neste cinema e, sempre íamos assistir filmes e "ficar" com nossas colegas da ETFA,sempre às quartas-feiras à tarde, quando saíamos da aula. Nessa época tinha um moleque apelidado de "arroto". Nós pagávamos um Coca-cola prá ele que ingeria todo o líquido(290 ml de um só gole, abria a porta que dava para a Sala de Projeção e arrotava bem alto, fazendo com que to-dos escutassem: "Cheeeeeeegueeeeeeeeiiiiiiii!", era uma risada em uníssono,geral, demorada...fazendo com que os funcionários corressem para saber quem tinha sido o "autor".
4. Cine Popular- nosso querido Populixo, localizado na Silva Ramos, próximo à Praça Santos Dumont, sem ar condicionado, sem conforto, com maquinário velho (sempre dava pane).Muitos fatos aconteceram nesse recinto: Um colega muito conhecido por ser um contumaz punheteiro, estava na maior quando o lanterninha o flagrou no momento do go-zo...pegou-o pela orelha e o colocou para fora. Quando dava pane, batíamos nas cadeiras,chamávamos palavrões e pedíamos nosso dinheiro de volta, Só voltava a calmaria quando recomeçava o filme. Assisti muitos filmes bons no Popular.
Um fato engraçado: o Bilheteiro ficava escutando o jogo de futebol em seu radinho de pilha e que dava prá ouvir lá de dentro. Imagina quan-do o locutor(Carlos Carvalho, da Difusora)gritava: _ atirou direto para o arco é comigo mesmo torcida do Naça,GOOOOOOOOOOOOLLLLLLLLLLL! Nós aproveitávamos e explodíamos também como se estivéssemos vendo o jogo: GOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOL! Era uma bagunça só! Lembro que
quando saíamos de lá por volta das 22:00h, nos dirigíamos ao Bar do seu Zé. português, na esquina daJoaquim Nabuco/Nhamundá, na Praça Auxiliadora para saborear um pão quentinho com manteiga e refresco com casquinha de gelo. Tempo bom que o tempo levou e que não volta nunca mais!
5. Cine Avenida - localizado na Avenida de Eduardo Ribeiro, quase em frente ao Odeon. Passavam filmes de Tarzan,Bang-Bang e de Romanos. Era nosso Cine predileto, até por causa dos tipos de filmes. A figura de Dona Iaiá, era,sem sombra de dúvida, o marco, o destaque principal dessa Casa deProjeção. Ela ficava o dia todo à porta do Cinema, sempre com uma maquiagem muito carregada, principalmente pelo Ruge e pelo batom. Da-va-nos bom dia, boa tarde ou boa noite, conforme o horário, sempre com um sorriso,como se ela mesmo fosse a atriz coadjuvante dos filmes do dia!
No Avenida existia a Galeria, que era um mezanino, de onde assis-tíamos doalto, os filmes que embalavam nossos sonhos juvenis.Algumas vezes fizemosextrapolações , como urinar na cabeça dos espectadores de baixo oujogar restos de comidas e bebidas que sobravam. No Avenida, efetuávamos trocasde Gibis: um almanaque valia por três, uma sessão extra por dois, Zorro,Cavaleiro Negro Fantasma,Mandrake,eram os mais procura-dos.
Foi nesse Cine que assisti a um filme que me deixou alguns dias muito impressionado: AMulher Serpente, com Sarita Montiel. Passava também muitos seria-dos, que ficávamos semanas e até meses para saber o final, esperando a fita chegar aos cinemas de Manaus. Geralmente após as sessões, su-bíamos andando a Avenida Eduardo Ribeiro, parávamos na Confeitaria Avenida, que ficava em frente ao hoje Edifício Cidade de Manaus, para saborear um refres-co de groselha, com os deliciosos salgados ou doces que até hoje, ao fechar os os olhos,sinto o cheiro e o sabor...Ah,minha Manaus!
6. Cine Guarany_ em frente ao Politeama, mas com a frente voltada
para a Praça da Polícia e que em nome do progresso, virou Banco,teve demolida sua linda construção em forma de Castelo Medie-val. Ali vivi muitos momentos felizes e inusitados com a turma do Co-légio Estadual.
Sempre quesaíamos mais cedo do Colégio, íamos para lá com nossas namoradas de Escola. Nos massageávamos de todos os modos possíveis e imagináveis, sem sermos incomodados. Foi a época de maior cultura sexual que tive, com aulas extremamente saudáveis e bem assimiladas. Teve uma época que este Cine começou a apresentar sessões de terror às 24:00h. Imagine na hora que o vampiro ia atacar, passava bem perto de sua cabeça, um morcego voando ebatendo asas? Tinha também a figura de um ex-Padre, que ficava esperando a sessão terminar para ficar "azarando" os rapazes que passavam pela calçada. Como às vezes ele não era notado, dobrava o corpo, levantava a batina e mostrava a bunda para todos.Era um figuraço!
7. Cine Ypiranga - Na Rua Carvalho Leal, ao lado do Palácio Rodoviário,hoje Universidade do Estado do Amazonas, cine um pouco afastado do centro da cidade, razão pela qual, pouco o frequentávamos, apenas quando passava um filme famoso e, tínhamos então que nos deslocar de táxi até lá.Fui muito pouco a este cinema,freqüentei mais o Cine Palace,no Boulevard Álvaro Maia, uma das Salas mais modernas à época e, que, às quartas-feiras à noite, exibia filmes a CR$ 0,50 em moeda para que tivessem troco no domingo. Nessa Sala também assisti ao Festival de Bandas e Grupos Musicais, como The Blue Birds Band, Os Embaixadores,Quarta Projeção,Os Infernais e outros.
8.CineIdeal- Em São Raimundo, fui apenas duas vezes, na época em que Gilberto Mestrinho era o governador, no dia das crianças, em que to-dos os cinemas eram gratuitos. Como nesse dia todas as Salas estavam lotadas, decidimos ir até o Cine Ideal e lá conseguimos entrar. Outra vez fui assistir Touro Indomável, foram as únicas vezes em que fui a este cinema, agora, ao Sul-América fui muitas vezes e ao São Raimundo.
Interessante é que nessa época, você pagava em um desses Clubes e, se fosse ao outro, não pagava ingresso, era a disputa por público. Pagava-se um e tinha direito a entrar nos dois.
9. Cine Vitória – Localizado no alto de Educandos (o prédio pre-serva até hoje suas características. Dizem alguns que no barzinho em frente, houve uma das brigas entre Waldick Soriano e Tigre do Amazo-nas. Eu nunca entrei nesse cine, apenas passava por lá algumas vezes, sem nuncatê-lo freqüentado, ficava para nós, muito distante. Diziam alguns que era o maior de todos, inclusive maior que o Ypiranga e o Palace.Essa era nossa Manaus na década de 60. Muitas Salas de Proje-ção para o tamanho da cidade, que com a chegada da Televisão, começou a acelerar o fechamento desses estabelecimentos que tantas saudades deixaram,tantos sonhos embalaram, de nossos desejos juvenis...
*Almir Barros Carlos, Pedagogo, com Especialização em Gestão Escolar, Mestre em Educação. Professor da Rede Pública de Ensino e da UEA, Ex Diretor da Escola Solon de Lucena e M.`.M.`., escreve sempre neste endereço.
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